Como estamos
desenvolvendo um projeto para preservar a memória e acontecimentos antigos de Ibiraçu, neste
domingo o nosso entrevistado é o senhor José Ramos Menezes, o “Zé Ramos”, nascido
em Ibiraçu, 77 anos, servidor público municipal aposentado, residente há cinco
anos na Casa de Repouso “Semente de Jesus” em Cachoeirão, município de Fundão[onde
também estão os ibiraçuenses Noé Vieira da Encarnação e Aristóteles Ferreira, o
“Neguinho”], que nos relata fatos para contribuir
com a história de Ibiraçu.
José Ramos na Casa de Repouso
Ibira Sul: Sua família é de Ibiraçu?
Senhor José Ramos: Meu pai José Corcino veio de Minas Gerais para Pau Gigante, onde se casou
com Maria Santana e passou a trabalhar como carreiro e tropeiro para o senhor Angelinho
Bonesi. Ele tinha como sobrenome Menezes. O Ramos que tenho no nome, foi uma
sugestão do então tabelião Juca Motta, que tinha o cartório na avenida Cond´Eu, casarão que pertenceu ao
senhor Lima, por ter nascido no dia de Ramos. Eu morava na Biquinha, onde
nasci, numa casa de madeira que pertencia a família de Constantino Furieri,
ladeada de um paiol que guardava arreios de animais, pois ele tinha tropa. Éramos
vizinhos dos senhores Olímpio e de Getúlio Ribeiro, que moravam do outro lado
do rio da Biquinha, propriedade pertencente a
Alair Bonesi. Mais embaixo, onde você mora[Ruberval], havia uma casinha
de estuque e coberta de palha muito antiga, onde morava o senhor “José Birau”, pai de “Luiz Birau”, o “caranguejo”. Mais no alto, próximo do morro do Vitor,
havia algumas casas de estuque, também cobertas de palhas, onde moravam algumas
pessoas que não se recorda o nome, contudo, afirma que se tratava as famílias citadas
todas negras, como é a minha própria, porém,
não tenho recordações de ter aquele lugar
se chamado “Burgo Escuro”, o que deve
ter ocorrido muito antes.
Ibira Sul:
E a vida na infância, como era?
Senhor José Ramos: Ainda quando menino, meu pai decidiu
ir morar aonde hoje é o bairro Boa
Vista. Quando nos transferimos para lá,
somente havia três ou quatro
casas, todas de pessoas oriundas do
Nordeste, como eram a família do senhor Joaquim Gomes, um açougueiro que tinha um comércio no antigo prédio da família Boff na Conde´Eu, onde depois foi o Banco do Brasil, a família Ferreira, que era nordestina mas morou no alto do Morro do Aricanga,
e dos irmãos Zeco e Balbino Jerônimo,
oriundos de Quixadá. Lá ainda não
existia a igrejinha, que foi construída por dona Marieta Moro, que foi casada
com Vicente Severino, também Nordestino. O cemitério era cercado de estacas e
com alguns arames farpados. Não havia
água no bairro Boa Vista, e os moradores pegavam água no rio Taquaraçu, num poço próximo do antigo abatedouro da avenida
Getúlio Vargas. Para chegar ao rio, passava-se pelo casarão da família Boff,
que ficava no meio de uma pastagem de pernambuco,
além de ter que passar por outras duas
ou três casas mais abaixo, todas de
estuques, uma delas, onde morou depois o senhor João Porfírio.
Ibira Sul: E a igreja católica, era influente?
Senhor José Ramos: Existia um acirramento muito grande
na política de Ibiraçu, muito maior do que hoje. Disputavam o poder doutor Barroso,
que foi prefeito, que abriu estradas até Colatina, contra a família Bonesi, que
também teve prefeito. Porém, a palavra final na política praticamente quem dava eram os padres, dois
irmãos, Luis e José não se recordando o
sobrenome, que tinham uma irmã que veio
da Europa com eles e se chamava Anita. Os padres realizavam a festa de
Nossa Senhora da Saúde no seminário, o que atraia muita gente.
Ibira Sul:
E o nosso futebol?
Senhor José Ramos: Joguei no América. Havia também
o Vitória, que tinha o campo em São
Cristóvão, atrás do posto Padre Eustáquio. Os dois times jogaram uma única vez,
porém, como deu uma grande briga, a
partida não acabou. Depois disso,
eu propus ao padre José Simionato a união dos dois times, o que ocorreu em
1959, sendo Jorge Pignaton[meu pai], o
primeiro presidente. No América Jogavam Preto, Lourival Grampão, Chico Simoa, caboclo
Adolfo, todos muito brigões.
Ibira Sul:
Viajavam pelas cercanias de
Ibiraçu?
Senhor José Ramos: Muito. Era Mariano, caçava
muito e pescava. Íamos com frequência a Pendanga, que para chegar, somente a pé
ou a cavalo, passava-se pelo Morro do Vitor até a fazenda do Da Ross, onde havia
um campo de futebol, onde joguei muitas
vezes. Depois passávamos pela olaria dos De Barbi e pelo britador da família Gorza e aí chegávamos em Pendanga, que
era um grande centro de comércio de
café.
Casa de Repouso Semente de Jesus
Ibira Sul:
E o centro da cidade de Ibiraçu?
Senhor José Ramos: O Fórum da cidade funcionava no
segundo andar da prefeitura municipal e as construções do centro eram os
casarios cobertos de zinco. Seu Pascoal Campagnaro tinha uma venda grande, aonde foi depois a padaria de Modesto
Campagnaro, sendo a segunda padaria da cidade montada por Pedro Pignaton,
que ficava uma do lado da outra na
subida do morro para o então único bairro, hoje o Boa Vista. Carlos Pagiola
também teve depois uma padaria, que funcionava aonde hoje mora Loloi sua filha.
Porém, na enchente de 1942, a
cozinha do prédio de Carlos Pagiola, marido da professora Ericina Macedo
caiu. A enchente foi tão violenta que do Boa Vista via-se a baixada toda alagada.
Uma coisa assustadora. Na cidade havia ainda um advogado, que era o Dirceu Mota, e uma farmácia, também só existia uma, que funcionava no prédio em frente ao
Banestes. Todos da cidade pegavam água na Biquinha para beber e iam em carriola. Um fato marcante foi o acidente em frente a
estação do Aricanga, que matou nove operários que faziam a estrada. Me lembro do
enterro dos operários, quando passaram nove caixões seguidos pela rua, todos moradores de outras localidades, mas que foram enterrados no cemitério de Ibiraçu, como pode ser observado várias covas, uma do lado da outra.
OBS: Antecipei a Entrevista, por que tenho que trabalhar a noite em Colatina e amanhã cedo descansar.
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