Dona Maria Barbosa fará 101 no próximo mês
Ibira Sul: A senhora nasceu no Morro do
Aricanga?
Senhora
Maria Barbosa: Sim! Meu pai, que nasceu em Rio da Prata, passou a
morar no lugar denominado “Caldeirão”, que fica no Morro do Aricanga, aonde nasci
e me criei, juntamente com outros vários irmãos. Em “Caldeirão”, ao Leste da
montanha, quase no dorso, há um olho d´água, onde habitavam várias famílias de povos
da raça indígena em seu entorno. Nosso povo é oriundo da região de Mata Limpa e Gimuhuna, planície
atlântica do município de Aracruz. Quando eu era criança, meu pai e outros
moradores de Aricanga já transitava pelas
montanhas da região de Rio da Prata, Ibiraçu, onde ele havia nascido, que também já era habitada naquela época por
povos indígenas. Iam a pé e traziam nas
costas farinha ou taquaras para fazer peneiras, único ofício, além da produção de farinha e beiju que havia e que eram negociados com outros mantimentos no
mercado do hoje município de Aracruz, não sabendo se era em Sauaçu, Santa Rosa
de Lima, ou Santa Cruz.
Ibira Sul: E como era a vida?
Senhora Maria Barbosa: Fui casada com Francisco Ignácio, homem
mestiço dessa região, com quem tive nove filhos, e os criamos no meio da mata,
dentro de uma casinha de madeira e palha, quando tudo por aqui ainda era tomado
por florestas virgens. A luz na cidade de Ibiraçu somente foi vista do alto do
Morro do Aricanga, quando eu já era muita adulta. Vivíamos para a pesca no rio
Preto, onde na década setenta perdi duas netas afogadas de uma só vez quando
pescavam. Lucia de 12 e Balbina de 13 anos.
Só se conseguia comprar alguma
coisa para casa quando vendia-se peneiras ou farinha. No Morro do Aricanga,
depois que já era adulta, vivia umas trinta famílias, todos praticamente
descendentes indígenas, e também algumas
nordestinas, mas muito tempo depois.
Lembro-me das famílias dos Matos, Ignácio, Adão, estes
do outro lado da montanha, Nascimento e a minha Barbosa, que eram muitas espalhadas pelas matas do Aricanga.
Veterano da Revolução de 1930
marido de dona Maria Barbosa,
fato difícil de entender, pois, era praticamente
uma pessoa nativa da floresta do Aricanga
uma pessoa nativa da floresta do Aricanga
Meu
marido foi convocado para a revolução de 1930(provavelmente), devido um mínimo conhecimento que adquiriu
frequentando os poucos centros de
comércios no município de Aracruz e Pau Gigante(provavelmente).
Uma das filhas, já falecida, da prole
de nove filhos de dona Maria Barbosa,
de características totalmente indígenas
de características totalmente indígenas
Ibira Sul: E quando o homem branco chegou na região do
Morro do Aricanga?
Senhora
Maria Barbosa: Muitos frequentavam a
igrejinha de Nossa Senhora de Fátima, hoje em ruínas, onde eram realizadas festas religiosas e ia até o padre, ou então, caçando, pois dava muita caça, desde pacas, jaguatiricas, macacos, além de muitas cobras. Mas na
verdade, quando as pessoas da cidade começaram a frequentar mais assiduamente o Morro do
Aricanga, foi a partir da instalação da torre de transmissão de TV, sendo a primeira há quase meio século. Depois que
construíram a torre, fizeram também um
cômodo e colocaram uma televisão. A noite, muitos moradores da região, inclusive de Santa Maria, iam conhecer
aquela novidade. Quem tomava conta era uma pessoa da família Matos. Para chegar ao alto do Aricanga, os objetos usados
na construção e montagem da cabine e da torre foram quase todos transportados nas
costas dos nativos do Morro do Aricanga. Foi uma luta sem fim. O transporte
começava na propriedade de Elísio
Rosalém e acabava no cume do Morro do Aricanga.
Transporte de material para a torre
do alto do Morro do Aricanga
Ibira Sul: E o que explica essa saúde para conseguir
chegar aos 101 anos?
Senhora Maria Barbosa: Até poucos anos fumava cachimbo e bebia, e isso nunca me prejudicou. Mas o sucesso dessa vida longa deve ter sido por que vivi quase a vida inteira no meio das florestas virgens, bebendo água pura, o que me deixava feliz e despreocupada do mundo difícil que hoje vivemos, pois, não faz muitas décadas que estou na cidade.
OBS: Antecipei a Entrevista, que seria amanhã, por ter que trabalhar essa noite em Colatina e amanhã ter qur descansar.
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